quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

RIO BALSAS

Afluente do Parnaíba, o Rio Balsas também está presente na memória da minha infância.
Rio estreito, mas de correntezas fortes, corta a cidade do mesmo nome, no sul do Maranhão.
Onde corta a cidade, é utilizado por seus moradores para o lazer, ao longo de seu leito, povoado de bares e restaurantes.
Quando menino, lavadeiras de roupas compunham sua paisagem, com seus cânticos, sentadas nas tábuas, onde esmurravam as peças de roupa, em estalidos secos e persistentes.
A ponte sobre o rio, de madeira, era o trampolim dos  meninos livres. Compunha um repertório de travessuras permitidos pelas águas faiscantes do rio, no sol do verão.
Câmaras de pneus desciam o rio freneticamente, tangidas pelos gritos de alegria. Os comboios de crianças atravessavam o rio a nado, calculando a distância para sair do outro lado, por conta da forte correnteza.
Eu fui menino adestrado pelo rio, fugindo aos olhos vigilantes dos pais para me jogar naquelas águas turvas e perigosas. Não poucos meninos foram tragados pelas corredeiras traiçoeiras.
Mas, passada a comoção inicial, voltavam as brincadeiras, sob os olhos preocupados dos adultos. Ninguém conseguia manter a meninada longe do rio e os adultos sabiam que nós apenas estávamos cumprindo o destino de todas as gerações nascidas sob os auspícios do grande e majestoso rio.
Além dos saltos ornamentais de cima da ponte, o rio convidava para desafios maiores. A travessia a nado era pouco, quando se via adultos exímios nadadores e mergulhadores. Lembro de um surdo-mudo que atravessava o rio mergulhando de um só fôlego. Que inveja. 
E havia os tarrafeiros, filhos dos pescadores, que, ainda meninos, atravessavam o rio com o petrecho de pesca nas costas. Chumbada nas bordas, a tarrafa podia representar quase o peso de uma criança.
Eles chegavam exaustos, seguindo os pais, orgulhosos da façanha que poucos se atreviam.
Com meu pai, em pescarias menos ousadas, repeti por fim a travessia, com a tarrafa a tira colo. Minha mãe nem sonhava com essa travessura. Mas era nos remansos do rio que buscávamos o peixe, sem medo dos garranchos espinhosos e das raivosas piranhas que vinham buscar o pescado enredado na rede.
Mais medo eu tinha do esporão do mandi, dormindo no chão do rio, embora nem de longe fosse comparável ao ataque da raia.
Nunca vi ninguém usar botas ou luvas em pescaria. E a lanterna cegava o pescador, de olhos acostumados na penumbra. 
Se você nunca comeu peixe assado com farinha na beira de um rio, não pode saber do que estou falando.
O rio Balsas é testemunha. Acredite.


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